A CRÔNICA
Ao ler crônicas, você conhece a visão de
mundo daquela pessoa que escreveu o texto. Tão interessante quanto isso é você
mesmo tentar encontrar a sua forma de ver e questionar o mundo ao seu redor.
Como? Escrevendo sua própria crônica. Além de observar mais atentamente as
pessoas e situações que fazem parte do seu dia-a-dia, você estará exercitado
sua redação ao tentar construir textos claros e, ao mesmo tempo, criativos.
As etapas abaixo podem servir como um guia
caso você esteja começando a se aventurar pelo mundo da crônica. Com o tempo,
você desenvolverá seu próprio processo criativo e o texto surgirá de forma
natural, sem que seja necessário seguir etapas definidas.
Etapas para escrever sua crônica:
1. Escolha algum acontecimento atual que lhe
chame a atenção. Você pode procurá-lo em meios como jornais, revistas e
noticiários. Outra boa forma de encontrar um tema é andar, abrir a janela,
conversar com as pessoas, ou seja, entrar em contato com a infinidade de coisas
que acontecem ao seu redor. Tudo pode ser assunto para uma crônica.
É importante que o tema escolhido desperte
o seu interesse, cause em você alguma sensação interessante: entusiasmo,
horror, desânimo, indignação, felicidade... Isso pode ajudá-lo a escrever uma
crônica com maior facilidade.
2. Muito bem. Agora que você já selecionou um acontecimento interessante, tente formular algumas opiniões sobre esse fato. Você pode fazer uma lista com essas idéias antes de começar a crônica propriamente dita. Frases como as que seguem abaixo podem ser um bom começo para você fazer a sua lista:
"Quando penso nesse fato, a primeira
idéia que me vem à mente..."
"Na minha opinião esse fato é..."
"Se eu estivesse nessa situação, eu..."
"Ao saber desse fato eu me senti..."
"Sobre esse fato, as pessoas estão dizendo que..."
"A solução para isso..."
"Esse fato está relacionado com a minha realidade, pois..."
"Na minha opinião esse fato é..."
"Se eu estivesse nessa situação, eu..."
"Ao saber desse fato eu me senti..."
"Sobre esse fato, as pessoas estão dizendo que..."
"A solução para isso..."
"Esse fato está relacionado com a minha realidade, pois..."
Como você deve ter
notado, é muito importante que o seu ponto de vista, a sua forma de ver
aquele fato fique evidente. Esse é um dos elementos que caracterizam a crônica:
uma visão pessoal de um evento.
3. Agora que você já formou opiniões sobre o acontecimento escolhido, é hora de escrever sua crônica. Seu ponto de partida pode ser o próprio fato, mas esse também pode ser mencionado ao longo do texto, como ocorre na crônica exemplificativa de Ricardo Semler.
Escreva! Pratique!
E procure usar a criatividade para criar seu próprio estilo, pois é isso que faz
de um escritor um bom cronista.
Se você está
interessado em saber um pouco mais sobre crônicas, aqui vão algumas dicas de
livros que você pode consultar:
- A Crônica - O
Gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Editora da UNICAMP.
São Paulo.
- A criação
literária - Prosa. Massaud Moisés. Editora Cultrix.
- A crônica.
Jorge de Sá. Série Princípios. Editora Ática
Origem e desenvolvimento da crônica
A palavra crônica deriva do Latim
chronica, que significava, no início da era cristã, o relato de
acontecimentos em ordem cronológica (a narração de histórias segundo a ordem em
que se sucedem no tempo). Era, portanto, um breve registro de eventos.
No século XIX, com o desenvolvimento da imprensa, a crônica passou a fazer parte dos jornais. Ela apareceu pela primeira vez em 1799, no Journal de Débats, publicado em Paris.
Esses textos comentavam, de forma crítica, acontecimentos que haviam ocorrido durante a semana. Tinham, portanto, um sentido histórico e serviam, assim como outros textos do jornal, para informar o leitor. Nesse período as crônicas eram publicados no rodapé dos jornais, os "folhetins".
Essa prática foi trazida para o Brasil na segunda metade do século XIX e era muito parecida com os textos publicados nos jornais franceses. Alencar foi um dos escritores brasileiros a produzir esse tipo de texto nesse período.
Com o passar do tempo, a crônica
brasileira foi, gradualmente, distanciando-se daquela crônica com sentido
documentário originada na França. Ela passou a ter um caráter mais literário,
fazendo uso de linguagem mais leve e envolvendo poesia, lirismo e fantasia.
Diversos escritores brasileiros de renome
escreveram crônicas: Machado de Assis, João do Rio, Rubem Braga, Rachel de
Queiroz, Fernando Sabino, Carlos Drummond de Andrade, Henrique Pongetti, Paulo
Mendes Campos, Alcântara Machado, etc.
Ainda hoje há diversos escritores que
desenvolvem esse gênero, publicando textos em jornais, revistas e sites.
Características
da crônica
A crônica é, primordialmente, um texto
escrito para ser publicado no jornal. Este, como se sabe, é um veículo de
informação diário e, portanto, veicula textos efêmeros. Um texto publicado no
jornal de ontem dificilmente receberá atenção por parte dos leitores hoje.
O mesmo tende a acontecer com a crônica. O
fato de ser publicada no jornal já lhe determina vida curta, pois à crônica de
hoje seguem-se muitas outras nas próximas edições.
Há semelhanças entre a crônica e o texto
exclusivamente informativo. Assim como o repórter, o cronista se alimenta dos acontecimentos
diários, que constituem a base da crônica.
Entretanto, há elementos que distinguem um
texto do outro. Após cercar-se desses acontecimentos diários, o cronista
dá-lhes um toque próprio, incluindo em seu texto elementos como ficção,
fantasia e criticismo, elementos que o texto essencialmente informativo não
contém.
Com base nisso, pode-se dizer que a
crônica situa-se entre o Jornalismo e a Literatura, e o cronista pode ser
considerado o poeta dos acontecimentos do dia-a-dia.
A crônica, na maioria dos casos, é um
texto curto e narrado em primeira pessoa, ou seja, o próprio escritor está
"dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica apresente uma
visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista.
Ao desenvolver seu estilo e ao selecionar
as palavras que utiliza em seu texto, o cronista está transmitindo ao leitor a
sua visão de mundo. Ele está, na verdade, expondo a sua forma pessoal de
compreender os acontecimentos que o cercam.
Geralmente, as crônicas apresentam
linguagem simples, espontânea, situada entre a linguagem oral e a literária.
Isso contribui também para que o leitor se identifique com o cronista, que
acaba se tornando o porta-voz daquele que lê.
DESVENDANDO A CRÔNICA
Adiante, você verá
algumas dicas para escrever sua própria crônica. Mas, caso você ainda não
esteja muito confiante, aqui vai uma atividade que pode ajudá-lo a observar
melhor esse gênero literário.
"Escândalos derrubam financista
japonês"
Essa manchete foi
publicada no jornal Folha de S. Paulo no dia 23 de julho de 1991. Com
base nela, Ricardo Semler escreveu a crônica abaixo.
Crônica publicada
no jornal Folha de S. Paulo, em 28 de julho de 1991.
É de
puxar os olhos
E o camarão se mexeu. O danado estava
vivo! Posso parecer um pouco caipira, já tinha comido peixe cru em restaurante
japonês, mas cru e vivo, nunca! Foi só pegar no bicho com os tais pauzinhos e
vuupt, o camarão deu um salto de samurai de volta para o prato. E assim
progredia a visita ao Japão...
Descer no aeroporto de Narita leva à
reflexão sobre o que incentiva milhares de nisseis a abandonarem o Brasil à
procura de uma oportunidade no Japão. Logicamente, ganhar dinheiro verdadeiro é
uma razão. Em vez de trocarem o seu esforço por uma moeda-piada do tipo
cruzeiro, cruzado ou cruz-credo, o conforto de botar alguns iens no banco e
saber que ainda estará lá quando for verificar o extrato. Até aí tudo bem. Mas
fico pensando se o desespero é parte vital da decisão e se os nossos nisseis
sabem no que estão se metendo.
Esta semana foi interessante aqui. A primeira-ministra da França, Edith "menina-veneno" Cresson, disse que os japoneses não sabem viver, que mais parecem umas formigas. O pessoalzinho daqui ficou uma vara. Passados alguns dias, bomba em cima de bomba com casos magistrais de corrupção nos mais altos níveis (ao leitor distraído reafirmo que estou em Tóquio e não em Brasília). Começou com o Marubeni, acusado de desvios de propinas para políticos. Aí, foi a vez da Nomura, a maior corretora de bolsa de valores do mundo, que andou desviando dinheiro e dando propina para políticos. E, para finalizar a novela da semana, a Itoman vê os seus executivos saírem algemados por envolvimento em - pasmem! - desvio de fundos e propinas para políticos. E foram três casos totalmente independentes um do outro...
Rumar para o Japão à procura do pote de ouro
do fim do arco-íris é uma ingenuidade. O Japão é moderno, mas as suas tradições
milenares desafiam qualquer análise ou compreensão superficial. É a meca da
inovação, mas é também o país que mais copiou produtos na história industrial.
Tem ares de liberdade de mercado, mas é uma das nações mais protecionistas e
paternais do globo. É líder em tecnologia em diversas áreas, mas só deixa
japoneses legítimos assumirem qualquer cargo de importância nas empresas. Fã do
capitalismo livre, é mestre inigualável de intervenção estatal e poupança
forçada. É nação orgulhosa de sua raça, mas os seus ídolos de comerciais não
têm nem mesmo os olhos puxados, a exemplo de um comercial muito popular por
aqui com o nosso "acerera A-i-roton"! Aos nisseis que pensam em vir
para cá, cabe a mesma reflexão que vale para Nova Jersey ou Lisboa. Todas as
nações têm muito a ensinar, mas também muito a aprender. Nivelar as
expectativas com os pés no chão fará com que nossos imigrantes voltem algum dia
ao Brasil para ajudar a desatolar o nosso país com o que vivenciaram fora. É
bom colocar tudo no prato para evitar, como no caso do meu camarão rebelde, que
se acabe comendo cru...
Texto
extraído do livroEmbrulhando o Peixe - Crônicas de um Empresário do Sanatório Brasil. Ricardo Semler. Editora Best Seller. 2ª ed. São Paulo. 1992. p. 58 - 59.
Atividades com base na crônica
Com base na crônica
e na manchete do jornal acima, tente realizar as atividades a seguir:
1) Quais são as
idéias defendidas por Semler ao longo do texto? Tente fazer uma lista com essas
idéias.
2) Será que você
tem a mesma opinião sobre esse assunto? Faça uma lista com as suas idéias.
3) Em que parte do
texto Semler menciona o acontecimento que dá origem à sua crônica? No início?
Ao longo do texto?
4) Como Semler
encerra sua crônica? Há alguma ligação entre a frase que encerra e a que inicia
a crônica?
5) O escritor
estabeleceu alguma relação entre o Brasil e o fato ocorrido no Japão?
6) Qual o
"recado" central que Semler quer dar com esse texto? Existe, na
crônica, alguma frase que sintetize essa idéia?
Muito bem! Você pode fazer exercícios como esse usando crônicas recentes, que são publicadas em jornais e revistas.
O empresário Ricardo Frank Semler nasceu em São Paulo, em 1959. Ficou bastante conhecido graças ao seu livro Virando a própria mesa, no qual relata suas experiências ao propor uma gestão democrática em sua empresa. Foi eleito o empresário do ano em 1990 e em 1992. Mais tarde, passou a escrever crônicas para o jornal Folha de S. Paulo, abordando assuntos polêmicos de forma crítica e bem humorada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário