Donizete Galvão tem sua poética de carne e osso lembrada em nova edição
Mariana
Ianelli
- Especial para O Estado de S.
Paulo - 14 Março 2015
Poema-livro ilustrado, que homenageia autor, sai
agora com ampliação dos detalhes que o fazem literalmente antológico
Donizete Galvão, que faria 60 anos em 2015, talvez
nunca tenha sido tão lido e comentado, pelo menos de maneira tão fecunda. Entre
as publicações que vêm semeando sua poesia, há duas antologias: Ofícios do
Tempo, um panorama poético organizado por Lindsey Rocha Lagni, pela editora
Positivo, e Outras Ruminações, pela Dobra Editorial, que reúne 75 poetas
brasileiros em torno de versos de Donizete.
Outra publicação, com diferente
enfoque, é uma edição especial do poema Escoiceados,
com ilustrações do artista argentino Carlos Clémen, pela Casa de Virgínia, novo
selo da editora Musa. O livro, que inaugura a coleção Um Poema, Um Livro, estava prestes a
ser lançado quando Donizete morreu em 30 de janeiro de 2014. O caráter de
homenagem, neste caso, vem por acréscimo. Transformado em “poema-livro”, com
participação do próprio autor no projeto, Escoiceados
(que originalmente abre o livro Ruminações,
de 1999) pode ser lido agora numa ampliação dos detalhes que o fazem
literalmente antológico, não por acaso presente nas duas coletâneas lançadas no
ano passado.
Em poucos versos por página, o leitor vê em
destaque uma poética de “carne e osso” em seus aspectos fundamentais. Um
excelente aporte para essa leitura verso a verso está no texto de Priscila
Figueiredo que integra o volume. O ritmo breve e seco do poema, as figuras de
linguagem que lhe dão vigor, a mistura de dor com ternura no enquadramento de
uma cena de infância interiorana são alguns dos aspectos que Priscila aborda em
sua análise. Trotando num burrico cinza malhado “com fama / de sistemático”,
uma vez, pai e filho acabaram no chão. Na fábula de uma queda, a dimensão
simbólica desses “escoiceados”, a quem o poeta dá voz a partir de uma vivência
própria, revela-se com elementos mínimos. Interessante pensar no “sabor
regionalista” que a autora da análise, também poeta e crítica, depreende do uso
do termo “sistemático”, associando-o ao sul de Minas, terra natal de Donizete.
Com essa nova proposta de leitura em páginas
ilustradas é possível flagrar na economia verbal do poeta sua concentração de
meios, síntese de uma preocupação com o vigor da língua. Ruy Proença e Reynaldo
Damazio, que assinam os textos de orelha e contracapa do livro, fazem a ponte
entre o microcósmico e o panorâmico na poesia de Donizete: são eles também os
organizadores, juntamente com Tarso de Melo, da coletânea Outras Ruminações, espécie de
tributo coletivo a um poeta que sabia ser generoso no diálogo com seus
contemporâneos.
MARIANA IANELLI É POETA E AUTORA DE O AMOR
E DEPOIS, ENTRE OUTRAS OBRAS
ESCOICEADOS
Autor: Donizete
Galvão
Editora: Casa de
Virgínia (32 págs., R$ 42)
http://cultura.estadao.com.br/noticias/literatura,donizete-galvao-tem-sua-poetica-de-carne-e-osso-lembrada-em-nova-edicao,1650492
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