Schopenheur
por Jaya Hari Das
A filosofia
pessimista, atribuída ao filósofo alemão, talvez não passe de um preconceito ou
de um mal-entendido, quando analisada com outros olhos e comparada à vida e à
mensagem de outros homens excelsos da humanidade, como Platão, Epicuro, Nietzsche,
Buda e Jesus. O pessimismo
pressupõe uma desesperança no futuro, uma previsão ruim daquilo que sobrevirá,
ou, como encontrado nos melhores dicionários de nossa língua, "uma
tendência para encarar as coisas pelo lado negativo". Mas o que dizer destas
palavras: "A história nos mostra a vida dos povos, e nada encontra a não
ser guerras e rebeliões para nos relatar; os anos de paz nos parecem apenas
curtas pausas, entreatos, uma vez aqui e ali, e de igual maneira a vida do
indivíduo é uma luta contínua, porém não somente metafórica, com a necessidade
ou o tédio, mas também realmente com outros. Por toda parte ele encontra
opositor, vive em constante luta e morre de armas em punho"?
O que temos aí:
extremo pessimismo ou puro realismo? Quem dentre nós poderá ser tão otimista ao
ponto de negar a realidade que perpassa a história da humanidade e que pode ser
encontrada, sem grandes dificuldades, em qualquer cena urbana ou privada,
veiculada pelos meios da comunicação ou testemunhada na porta de nossas casas?
O nome Schopenhauer tornou-se quase sinônimo de "pessimismo" ao longo
da história da filosofia. A tendência didática de rotular ou categorizar
pensadores e correntes de pensamento estigmatizou um filósofo que teve como
único e máximo pecado ser honesto para com sua filosofia, que concebe a vida,
assim com todos os eventos da existência, como expressões diferentes da Vontade
- uma força que apenas quer existir, se evidenciar num mundo que não passa de
sua representação. Os quase dois séculos que nos separam de Arthur
Schopenhauer, entretanto, talvez ainda não se constituam um obstáculo para uma
defesa justa de suas ideias e para o vislumbramento de aspectos extremamente
positivos de sua filosofia. época em que Schopenhauer viveu, na Europa do final
do século 18 e início do século 19, tem algumas características peculiares, que
podem muito bem dizer do Zeitgeist de então. Will Durant, em seu A história da
filosofia, tenta encontrar razões para uma espécie de pessimismo comum àquele
período. Diz ele: "Por que será que a primeira metade do século 19
levantou, como vozes da época, um grupo de poetas pessimistas - Byron na
Inglaterra, De Musset na França, Heine na Alemanha, Leopardi na Itália [...] e,
acima de tudo, um filósofo profundamente pessimista, Arthur Schopenhauer?",
e acrescenta como resposta: "[...] Era bem difícil acreditar que um
planeta tão lamentável quanto aquele que os homens viam em 1818 estivesse
seguro nas mãos de um Deus inteligente e benevolente. Mefistófeles havia
triunfado e todos os Faustos estavam desesperados". Durant também é loquaz
ao dizer que "o pessimismo é o dia seguinte do otimismo".
Zeitgeist Expressão
alemã que significa, em tradução aproximada, "espírito da época". O
termo é bastante utilizado por ensaístas, sociólogos, historiadores e críticos
de arte para descrever a época em que uma determinada obra artística ou
movimento intelectual foi produzido. A banda de rock americana The Smashing
Pumpkins lançou em 2007 um álbum intitulado Zeitgeist.
Todo homem, ilustre
ou não, é fruto de seu tempo, e também vê o mundo à sua volta como a
representação de si mesmo, assim como sentenciado por um antigo filósofo grego:
"O homem é a medida de todas as coisas". Schopenhauer vê as coisas do
seu tempo, mas, acima de tudo, abrange com seu olhar filosófico, quiçá com sua
intuição (como talvez ele próprio preferisse dizer), o passado (constituído de
suas incursões pelas escrituras hindus e budistas), o presente (imposto a ele
frente a frente) e o futuro (projetado por sua invejável capacidade intelectual).
Assim, sua
filosofia traz, evidentemente, a sabedoria oriental, que inspira aqueles que
buscam respostas para seu sofrimento nos ensinamentos religiosos; a compreensão
do aqui-agora existencial, que une todos os povos e todos os indivíduos como uma
única nação de aflitos; e a visão profética, que, relendo os eventos da vida,
vaticina para todos, sem exceção, uma espécie de eterno retorno - um retorno ao
nada existencial, como último consolo à existência sofrida. Arthur Schopenhauer
teve como pai, Heinrich Schopenhauer, um rico comerciante que, além de ser um
homem rígido, era um marido rude, e que tem ainda contra si a forte suspeita de
ter cometido suicídio atirando-se no canal de Hamburgo. A mãe, Johanna
Troisener, era uma romântica, oprimida pelo marido, que só conheceu o bom da
vida após a morte dele. Apesar do pai ter feito tudo para que o jovem Arthur se
interessasse pelos negócios da família, não viveu o suficiente para
decepcionar-se com o filho filósofo, enquanto a relação deste com a mãe foi uma
das piores. Schopenhauer viveu grande parte de sua vida viajando pela Europa à
custa do dinheiro herdado do pai.
Foi um solitário,
tinha um cachorro, ao qual deu o nome de Atman (termo hindu para alma), e
pouquíssimos amigos. Para si mesmo, considerava sua vida como a ideal - a
relação com os humanos não era nada fácil, portanto, preferia a solidão. No
entanto, essa vida reclusa é rotulada por alguns autores como "uma vida
infeliz", o que fornece um ótimo ingrediente para fomentar a denominação
que darão a ele de "filósofo do pessimismo". Sua obraprima, O mundo
como vontade e representação (1819), só conquistou leitores após sua morte, e
Parerga e Paralipomena (1851) trouxe- lhe o tão desejado reconhecimento, mas
ele não viveu o suficiente para usufruir dele, pois morreu nove anos depois, no
dia 21 de setembro de 1860, solitário como viveu. A Vida como ela é Enxergar as
coisas tais como elas são pode ser uma tarefa amarga, mas também pode trazer
recompensas surpreendentes para aqueles que antes suspeitam de tudo que é doce
demais. É, provavelmente, por essa razão que o filósofo de Danzig impôs a si
uma vida de retiro e solidão, tentando ao máximo evitar dissabores provenientes
das frágeis e vulneráveis relações humanas, percebendo que esses bípedes (como
ele chamava os humanos) ainda não estão preparados para amor e amizade
verdadeiros.
Pensemos: quantas
pessoas mundo afora já não se desiludiram no amor e na amizade, e como
gostariam de jamais terem se apaixonado ou se dedicado fervorosamente a alguém?
O pensamento schopenhaueriano é, sem dúvida, um antídoto para péssimos exemplos
de relacionamento humano, ou até mesmo uma espécie de cura para males
intrínsecos à própria condição humana. Em seu A cura de Schopenhauer, Irvin D.
Yalom (o mesmo autor de Quando Nietzsche chorou) apresenta-nos uma trama
ficcional, na qual o filósofo, melhor dizendo, sua vida e obra, serve de
tratamento para um personagem que sofre de compulsão sexual. O enredo do livro
trata de um grupo de pessoas que participa de sessões conjuntas de terapia.
Cada uma delas, é claro, está ali por um problema particular que precisa
resolver, no entanto, todas elas se veem, de repente, bombardeadas por citações
de Schopenhauer, recitadas pelo novo integrante, que acabam por dominar as
discussões do grupo e, ao mesmo tempo, proporcionar, de forma inusitada, novas
perspectivas em suas vidas. Esse livro é, sem dúvida, um exemplo maravilhoso de
que, se deixarmos de lado o estereótipo tão massificado de uma filosofia
pessimista em Schopenhauer, encontraremos nela sabores e aromas terapêuticos,
insuspeitados e benfazejos a qualquer de nós - bípedes. A frase "Nenhuma
relação é perfeita porque as pessoas são imperfeitas", que abre o sétimo
capítulo de Mais Platão, Menos Prozac (atualmente, uma espécie de manual do
chamado aconselhamento filosófico), de Lou Marinoff, tem tudo a ver com o
pensamento de Schopenhauer, colocando-o no páreo com os pensadores utilizados
nos consultórios dessa prática filosófica e outras abordagens terapêuticas que
exploram as mais inovadoras técnicas psicofilosóficas. Devido à sua
extraordinária filosofia, a essência do pensamento desse filósofo orbita
tranquilamente entre as máximas de Platão e Epicuro, de Buda e Kant, de Jesus e
Nietzsche, sem comprometer o teor e a substância delas, nem o valor e a
autenticidade de seus autores.
Se o tédio, a
angústia, a depressão e a tristeza podem ser vencidas com máximas filosóficas,
aliadas a uma abordagem mais ampla e mais fidedigna (nem tanto racional) do
mundo, o pensamento de Schopenhauer certamente pode desencadear a desilusão
positiva, a desconstrução daquela ilusão criada pelo próprio indivíduo, em face
de um mundo caótico, de uma vida infeliz e de uma realidade estressante. A
filosofia de Schopenhauer explica que a natureza interessa-se menos pelo
indivíduo e mais pela sua espécie. Portanto, tenta preservar essa personalidade
que chamamos de "eu" será sempre perda de tempo e acréscimo de
sofrimento, pois esse "eu" não pertence a si mesmo, mas é parte de
algo bem maior, um "nós", que é sua espécie. Se não há consolo em
saber que essa personalidade desaparece no oceano existencial - para só então
retornar infinitas vezes, como milhões de outras personalidades inconscientes
de quantas pessoas já foram, quantas vidas viveram, o quanto amaram, foram
amadas ou sofreram - não é culpa do filósofo que assim seja, ele é apenas o
decifrador de um código da natureza, que a despeito de nosso apego e romantismo
pela vida, do alto de sua sabedoria não racional, não enxerga aqui na Terra
homens, mulheres, crianças, pais, filhos, amantes ou rivais, como fomos
condicionados a ver aqui embaixo. Ele enxerga apenas a família, a espécie
humana, que, num ato de pura vontade e necessidade, mantém a roda existencial
girando indefinidamente. Destemor da morte Dentre as contribuições positivas da
filosofia schopenhaueriana para o bem-viver da humanidade, podemos citar a
exortação ao destemor da morte, ou mais precisamente do valor dela em face de
uma vida sofrida e miserável, e, acima de tudo, a compreensão de que ela nada
mais é do que o fim de todo sofrimento, o retorno ao descanso, à quietude.
Valorizar a morte pode parecer à primeira vista desvalorizar a vida, mas pode
também dar novo significado à existência de quem se sente realmente um
"lutador" neste mundo. A vida da maioria de nós é literalmente uma
"luta" e considerar a morte não como uma derrota, ou um fim inglório,
e sim como retorno à quietude da própria essência, é comparável à promessa
cristã de alcançar o céu ou à perspectiva budista de realizar o nirvana. Diz o
próprio filósofo: "Trabalho, aflição, esforço e necessidade constituem
durante toda a vida a sorte da maioria das pessoas", mas acrescenta, logo
adiante, algo que eleva a dignidade humana: "Para uma tal espécie, como a
humana, nenhum outro palco se presta, nenhuma outra existência".
Pensamento tão
claro e inspirador nos faz lembrar o poeta maranhense Gonçalves Dias, quando em
versos nos diz: "Não chores, meu filho; não chores, que a vida é luta
renhida: Viver é lutar. A vida é combate que os fracos abate, que os fortes, os
bravos, só pode exaltar". Ou como diria o próprio filósofo: "A
felicidade está mais na realização do que na posse ou na saciação", de que
concluímos resignadamente que "a vida sem tragédia seria indigna de um
homem". É Will Durant que nos vai lembrar que a filosofia de Schopenhauer
semelha muito os ensinamentos do Cristo (e, é claro, os de Buda). Diz o
historiador: "O cristianismo é uma profunda filosofia do pessimismo. O
poder através do qual o cristianismo conseguiu vencer primeiro o judaísmo e
depois o paganismo da Grécia e de Roma está unicamente no seu pessimismo, na
confissão de que nosso estado é excessivamente deplorável e pecaminoso,
enquanto o judaísmo e o paganismo eram otimistas".
Nós, com
facilidade, podemos encontrar passagens bíblicas que levam a considerações
desse tipo, mas que, vistas por um outro prisma, apresentam a morte como uma
valorização da vida. Vale lembrar que, proferidas por Jesus, essas
considerações em favor da morte tomam ares de inspiradora fé no significado da
própria vida. "Aquele que tentar salvar sua vida, perdê-la-á. Aquele que a
perder, por minha causa, reencontrála- á", disse o Nazareno. E Buda assim
se pronunciou: "Olhai ao vosso redor e contemplai a vida. Tudo é passageiro
e nada duradouro. Só nascimento e morte, crescimento e decadência, combinação e
dissolução". E ainda Epicuro, tendo examinado a vida, sentenciou: "A
morte não nos concerne, pois quando somos, ela não é, e quando ela é, já não
somos". Quando o filósofo diz: "Tão próximo de nós se localiza uma
região em que nos livramos de todo nossa miséria; mas quem é dotado de força
para ali se manter?", quase podemos ouvir, concomitantemente, a voz do
Filho do Homem, dizendo: "O Reino dos Céus está dentro de vós!", e a
do Príncipe de Kapilvastu sentenciando: "Ninguém trilhará por ti o caminho
- acenda tua própria lâmpada e ande!". Será que ainda restam dúvidas
quanto à veracidade e à utilidade de tal filosofia? Será que é preciso um novo
rótulo para o frasco de um remédio que, por ser amargo, não merece prescrição
para males ainda mais amargos da existência? Creio que não. Schopenhauer diz
com despojamento de filósofo o que os avatares ensinam ao modo dos deuses.
"Quando, por um instante, conseguimos estar livres do jugo da vontade, da objetividade
do querer que nos impulsiona, vivemos o estado sem sofrimento, considerado por
Epicuro como o mais elevado dos bens e o estado dos deuses", diz o
filósofo. A vida magnânima do Cristo culminou com seu martírio, e a de Buda,
com uma morte tão comum quanto a de qualquer dos mortais. Para seres excelsos,
assim como para o homem comum (produto industrial da natureza, segundo
Schopenhauer), a existência conduz inexoravelmente à morte, com maior ou menor
grau de sofrimento em seu transcurso. O que condiz muito bem com sua máxima:
"Uma vida feliz é impossível; o máximo que o homem pode conseguir é uma
vida heroica".
O filósofo defende
que nós, seres humanos, nada mais somos do que a objetivação de uma vontade de
existir. O que levará Durant a acrescentar em sua obra, com certa jovialidade e
otimismo, páginas à frente: "A vontade, claro, é uma vontade de viver, e
de viver ao máximo. Como a vida é cara a todas as coisas vivas! E com que
paciência silenciosa ela irá esperar o momento propício", o que corrobora
as palavras do próprio filósofo, ao dizer: "Mesmo no reino orgânico vemos
uma semente seca preservar a força inativa da vida durante três mil anos e,
quando finalmente ocorrem as circunstâncias favoráveis, desenvolver-se numa
planta". Se ainda me for permitida outra comparação, não seria demais
lembrarmos as seguintes palavras do mestre de Belém: "Considerai como
crescem os lírios do campo; não trabalham nem fiam". A filosofia de
Schopenhauer também realça aquela nobreza que cobre de louros o espírito e o
caráter do ser humano, quando este consegue perceber que seu valor como
protagonista da existência não está diretamente relacionado com suas posses, e
que, por vezes, a riqueza é um entrave ao autoconhecimento, e a pretensa
felicidade almejada jamais pode ser outorgada por outrem.
Diz o filósofo:
"Os homens estão mil vezes preocupados em ficarem ricos do que em
adquirirem cultura, embora seja inteiramente certo que aquilo que um homem é
contribui mais para sua felicidade do que aquilo que ele tem". E ainda:
"A felicidade que recebemos de nós mesmos é maior do que a que conseguimos
em nosso meio", o que vai concordar diretamente com Aristóteles, ao dizer
que "ser feliz significa ser autossuficiente". Quantos homens não
recebem honras apenas porque são ricos e poderosos, enquanto outros,
verdadeiramente valorosos, são esquecidos, apenas porque são simples e sem
posses? Schopenhauer, ao tratar da renúncia das riquezas, cita Siddhartha
Gautama e São Francisco de Assis. Sobre este último, ele relata um evento em
que, estando o nobre e jovem Francisco num baile em que se apresentavam as
belas filhas dos notáveis da época, foi perguntado: "Então, senhor
Francisco, não ireis brevemente eleger uma entre estas belas?", ao que
teria respondido: "Elegi para mim uma muito mais bela! La povertá". O
filósofo vê o apego à individualidade como "egoísmo", uma insensatez
para com a qual a natureza não se permite compactuar. Ser um e, ao mesmo tempo,
ser todos, ou pelo menos muitas possibilidades de ser muitos outros, é mais próprio
e adequado ao fluir existencial, à vontade da Natureza, ou, se preferirmos, à
vontade de Deus.
São Francisco de
Assis Francesco Giovanni di Pietro Bernardone nasceu em 1182 (ou 1181) na
cidade de Assissi (Assis), na Itália. Filho de um comerciante, conta-se que
vivera uma juventude mundada e excessiva, dedicando-se posteriormente a uma
vida religiosa e devotada aos pobres. Fundador da Ordem dos Frades Menores, ou
Ordem Franciscana, sua figura é uma das mais admiradas pelos católicos.
Siddhartha GautamaPríncipe
de Kapilvastu é o título atribuído a Siddhartha Gautama, fundador do Budismo.
Kapilvastu era um principado localizado na região de Lumbini, atualmente
pertencente ao Nepal. Em algumas fontes de consulta, o nome do distrito aparece
como Kapilavastu.
Alguns podem até
achar falta de modéstia em Schopenhauer, mas, observando criteriosamente seus
escritos, pode-se encontrar os créditos que ele declara a seus colaboradores,
como quando diz: "Reconheço que o melhor de meu desenvolvimento próprio
deve-se, ao lado da impressão do mundo intuitivo, tanto à da obra de Kant, como
à dos sagrados hindus e à de Platão". Como homem culto que foi, fez um
estudo aprofundado das religiões orientais, assim como do cristianismo e do
judaísmo, e sua ética pode ser comparada tanto com a budista quanto com a
cristã, conforme ele mesmo declara:
"A todas as
éticas da filosofia europeia, a minha se dispõe na relação do Novo Testamento
ao Antigo, conforme o conceito bíblico desta relação. [...] Minha ética [...]
possui fundamento metafísico, utilidade e objetivo: em primeiro lugar mostra
teoricamente o fundamento metafísico da justiça e do amor humanos, e em seguida
também aponta o objetivo a que estes, quando realizados com perfeição, devem
conduzir. [...] Poder-se-ia denominar minha doutrina a filosofia propriamente
cristã; por mais paradoxal que possa parecer àqueles que não atingem o cerne
das coisas, mas permanecem em sua superfície". O filósofo Friedrich
Nietzsche (1844- 1900), ao tomar conhecimento da obra de Schopenhauer, ficou
muito entusiasmado com o compatriota, chegando mesmo a escrever um livreto
intitulado Schopenhauer Educador. Nele podemos ler logo de início: "Se
tentar descrever o acontecimento que foi para mim o primeiro olhar lançado
sobre os escritos de Schopenhauer, devo primeiramente me deter um pouco a uma
ideia que me perseguia em minha juventude [...], imaginava que o terrível
esforço, o temível dever de ter de me ocupar de minha própria educação me seria
poupado pelo destino, porque encontraria no devido tempo um filósofo que fosse
meu educador, um verdadeiro filósofo que pudesse ser seguido sem hesitar, uma
vez que poria nele mais confiança do que em mim mesmo".
Esse educador foi
Schopenhauer, até Nietzsche romper com ele. Mas isso não diminui em nada o
valor de Schopenhauer, e podemos continuar citando os elogios do
homem-dinamite, enquanto admirador dele: "Sou desses leitores de
Schopenhauer que, desde a primeira página, sabem com toda a certeza que lerão
todas as outras e prestarão atenção à menor palavra que alguma vez tenha
proferido". Nietzsche, posteriormente, como mencionado, tornar-se-ia
opositor daquele que antes chamara de seu "educador", mas tal
rompimento é comum em discípulos que precisam se afastar de seus mestres para
que suas próprias ideias não sejam ofuscadas. É muito fácil encontrar em
Nietzsche falas que soam com o mesmo tom e timbre da voz de seu ex-educador.
Além disso, o amor fati (amor pelo destino) nietzscheano pode parecer aos mais
apressados uma contraposição à valorização da morte schopenhaueriana, mas,
quando analisada de perto, demonstra-se quase irmã gêmea desta. Revoltado com a
insistente perseguição a sua filosofia, Arthur Schopenhauer lança seu grande
desabafo contra as forças dominantes do pensamento filosófico de então, para
colocar cada um em seu lugar. "Agora terei de ouvir novamente que minha
filosofia é desesperada somente porque me expresso conforme a verdade, mas as
pessoas querem que se lhes diga que o Senhor Deus tenha feito tudo do melhor
modo. Dirijam-se à igreja, e deixem em paz os filósofos. Ao menos não exijam
que estes exponham suas doutrinas conforme seus ensinamentos: isto, fazem-no os
trapaceiros; os filosofastros: a estes, podem encomendar doutrinas à
vontade". Durant tece seus elogios ao filósofo de Danzig da seguinte
forma: "Devemos a Schopenhauer o fato de nos ter revelado nossos corações
secretos, de nos ter mostrado que nossos desejos são os axiomas de nossas
filosofias e de ter aberto caminho para uma compreensão do pensamento não como
um simples cálculo abstrato de eventos impessoais, mas como um inflexível
instrumento de ação e de desejo". função da filosofia é, sem dúvida,
promover o melhoramento da qualidade cultural e intelectual do ser humano, para
que a humanidade, como um todo, seja favorecida e possa caminhar a passos
largos para melhores dias, deixando escrito nas páginas invisíveis da história
os relatos de lutas e glórias que perfazem a existência da espécie humana, mas
não cabe a ela, de modo nenhum, instrumentar-se de mentiras doces e de vãs
lucubrações somente para, sentada no trono de "mãe das ciências",
governar o "Reino de Utopia", de tal forma a envergonhar até mesmo o
grande Thomas Morus, que provavelmente se contorceria em seu túmulo de tanto
asco e revolta.
Thomas
MorusPríncipe de Kapilvastu é o título atribuído a Siddhartha Gautama, fundador
do Budismo. Kapilvastu era um principado localizado na região de Lumbini,
atualmente pertencente ao Nepal. Em algumas fontes de consulta, o nome do
distrito aparece como Kapilavastu.
O filósofo do
pessimismo, como ficou conhecido Arthur Schopenhauer, tem muitas coisas
positivas a ensinar tanto aos miseráveis quanto aos prósperos, tanto aos
bípedes sem instrução quanto aos bípedes bem-instruídos, tanto aos pessimistas
quanto aos otimistas. A beleza de sua filosofia não é óbvia e vulgar como
alguns gostariam que fosse, ela é como o véu de Maya dos hindus, que impõe ao
comum dos homens uma ilusão multicolorida, enquanto esconde por trás de si o
esplendor da eternidade.
O próprio filósofo
pode nos dizer algo sobre isso, para que tudo o que aqui foi dito não fique
como não dito: "Mas certamente a verdade será sempre paucorum hominum, e
portanto deve esperar, tranquila e comodamente, pelos poucos que, por terem um
modo de pensar fora do comum, possam achá-la. [...] A vida é curta, mas a
verdade vai longe e tem vida longa; falemos a verdade".
http://amigosdofreud.blogspot.com/2010/12/vida-e-bela-em-schopenhauer.html
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