em Colunistas
Revista Bula
“Repare bem no que diz o silêncio.” “Escute, ele está
dizendo tantas coisas.” “Escute!” Ele diz mais do que meus gritos. Mais do que
meu choro. Diz sobre todas as vezes que repeti, repeti, insisti, insisti. E
depois, calei de cansaço. Meu silêncio é feito um tinteiro lacrado, de onde
escolho não fazer da tinta as palavras. Meu silêncio é um contra-argumento
exausto de gritar. Embora calado, fala muito. Meu silêncio é um conversador.
Diante desse mundo barulhento e corrido, nos
tornamos seres cada vez mais ruidosos e pouco reflexivos. Em companhia, o silêncio
incomoda; em solidão, angustia. Algo sempre precisa estar fazendo barulho, seja
a tevê, o som do carro ou os fones de ouvido abafando os pensamentos. As falas
esbravejadas também fazem seu estardalhaço. No intuito de aplacar o tormento
causado pela incompreensão, o som das palavras é aumentado até o último volume.
O barulho estremece as vozes internas, que saem incontroláveis feito uma
verborragia: enche-se o ouvido do outro com frases inúteis, enquanto o próprio
falador não escuta o que diz. Fico com a impressão de que estamos desperdiçando
o que o silêncio, em sua mais fina sintonia conosco, poderia nos oferecer.
Falar é um precioso remédio para a alma, mas, dependendo da dose, torna-se
veneno sem antídoto.
O silêncio é uma lacuna passível de ser mal interpretada.
O mais instigante é não saber o que ele significa exatamente — se é
indiferença, cansaço, dor, medo ou se é alguém tentando nos esquecer. O
silêncio que perturba é aquele que mais coisas diz. Há silêncios que respondem
aos tolos: calam os opositores, desbancam os argumentos dos conflituosos
insistentes. Há silêncios feitos para a alma respirar: permitem que o tempo
traga respostas contundentes. Há silêncios que são covardia: vêm dos que não se
resolvem, dos escorregadios, dos fugidios, dos que não se encaram de frente. Há
silêncios que dizem coisas bonitas: palavras que são lidas olho no olho, versos
tecidos no mistério das reticências, no calar das bocas enquanto uma mão segura
a outra silenciosamente.
O silêncio é provocador da fala. Precipita a
escuta. Portanto, quando quiser ser escutado não grite, silencie. “Eu quero
fazer silêncio. Um silêncio tão doente do vizinho reclamar. E chamar polícia e
médico e o síndico do meu prédio pedindo pra eu cantar”, diz a melodia
buarqueana. Por aqui, as cordas quietas do meu violão entoam o barulho
ensurdecedor que o meu silêncio faz. Eu hei de escutar tudo que ressoa de mim.
Aquilo que comunica minha alma. Pois há silêncios que falam tão alto que fica
impossível não ouvir o que eles querem nos dizer.
http://www.revistabula.com/7148-quando-quiser-ser-ouvido-nao-grite-silencie/
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