sexta-feira, 22 de abril de 2016

O CONGRESSO NOS REPRESENTA, ELIAS RIBEIRO PINTO



O CONGRESSO NOS REPRESENTA, 
ELIAS RIBEIRO PINTO


COLUNA DESTA QUARTA (20/4/16)
Nem sempre é agradável nos enxergarmos no espelho. À nossa porção Dr. Jekyll & Mr. Hyde. Médicos e monstros se alternando em suas falas, em seus comportamentos. O circo expôs suas aberrações (ou o sinônimo, wladimires), atrações, palhaços, malabaristas, trapezistas. 

     Bem-vindos ao Brasil. Por isso a sessão de domingo passado da Câmara Federal foi instrutiva, didática, pedagógica. Abrangendo de um extremo a outro, digamos, de Jean Wyllys a Jair Bolsonaro (mas outras extremidades também poderiam ser alcançadas), o Brasil estava (e está) representado naquele plenário.
     Sim. Eleitos democraticamente, os políticos nos representam. A mim, a você, ao país. Ainda que o deputado federal que recebeu seu voto não tenha sido eleito. Quem votou em Dilma, Aécio e Marina também votou para o Congresso. A propósito, você lembra em quem votou?
     Dos ditos progressistas aos visceralmente canalhas, dos panfletários (incluindo os bíblicos) aos nauseantes (ou os dois somados), dos (raros) sensatos aos tendenciosos (que só enxergam o que lhes interessa, à esquerda, à direita), era o Brasil que se expressava no microfone. Inclusive, independente de cada parlamentar a emitir seu voto, o que tivemos, ao final da votação, foi o correspondente retrato da população – revelado em pesquisas – em sua rejeição ao governo de Dilma Rousseff.
     Nem sempre é agradável nos enxergarmos no espelho. À nossa porção Dr. Jekyll & Mr. Hyde. Médicos e monstros se alternando em suas falas, em seus comportamentos. O circo expôs suas aberrações (ou o sinônimo, wladimires), atrações, palhaços, malabaristas, trapezistas. Mas como o espetáculo não pode parar, a lona continua armada. De domingo a domingo, no dia a dia brasileiro. Você faz parte desse circo (na plateia?).
     É da mecânica comportamental, psicológica. Basta reunir centenas de pessoas em um ambiente, compartilhando visões extremas, por horas, dias seguidos, intercalando pronunciamentos, palavras de ordem. Depois de um tempo (vimos no domingo passado), a bizarrice tende a se acentuar, em conluio com o pragmatismo populista (estamos nos referindo a políticos). Daí também “aquilo” nos parecer uma sala de aula em seus piores momentos, com alunos se atirando objetos, se prometendo brigas “lá fora”, chutes na canela e bulinagens em geral. Quem já viu um plenário em “esforço concentrado” sabe do que estou falando.
     Ao ver os deputados solando (inclusive na acepção futebolística do termo) sob a regência de Eduardo Cunha (olimpicamente indiferente às facas que lhe eram atiradas por integrantes da orquestra, do circo, como se ele fosse aquela mocinha que fica impassível no alvo), lembrei-me de diversos artistas e pensadores que buscaram representar o Brasil em suas obras.
     Lembrei de Mário de Andrade e sua síntese macunaímica (e Lula estava ali próximo), de Cazuza exortando o Brasil a mostrar sua cara, da cordialidade polimórfica de Sérgio Buarque de Holanda, da metamorfose ambulante de Raul Seixas (com seu ouro de tolo), dos dissimulados e bacharelescos, de Machado de Assis a Jorge Amado, do Brasil passado a limpo e a sujo, em Antonio Callado, João Ubaldo Ribeiro, da hora espandongada da volta, de Drummond, em que homens e mulheres imaginam esperar qualquer coisa, e se quedam mudos, últimos servos do negócio.
     Mas lembrei, principalmente, de Glauber Rocha. Claro, de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. Óbvio, de “Terra em Transe”. Mas, no resumo da ópera, do circo, o que me veio à lembrança foi o caos polifônico de “A Idade da Terra”, com o melhor e o pior do cineasta. Foi um dos filmes mais rejeitados de Glauber. Em sua profecia já quase póstuma, às portas da morte, o diretor vaticinou que sua obra final era o Brasil. A profecia se cumpre no que o país tem (ou poderia ter) de melhor e (com certeza) de pior.
     Devemos seguir até o enjoo, vomitar essa dor? Não, o tempo ainda não chegou de completa justiça. Fundimo-nos no mesmo impasse.
     Moreira Franco, porta-voz do quase-ex-atual (vice-)presidente Michel Temer, disse que o problema com que de imediato se defrontará o Temer presidencial será, em primeiro lugar, a economia, em segundo, a economia, e em terceiro, idem. Pode ser, diante da terra arrasada que o terrível governo de Dilma legará. Mas o problema do Brasil, hoje e sempre (até quando?), será educação, educação, educação. Pátria educadora? Como diria minha cunhada, é só capa. Fachada cenográfica.
     Que a flor da democracia venha romper o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

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