ASSALTADO POR UM
GUARDA-CHUVA
ELIAS
RIBEIRO PINTO
COLUNA DESTA SEXTA (21.8.15) NO JORNAL DIÁRIO DO PARÁ
Sinto
a pressão do cano do revólver mais forte entre as minhas costelas. Mas o ladrão
permanece estranhamente em silêncio. Já me dispunha a levantar os braços quando
me dei conta do que acontecera.
1
Não faz muito tempo eu e a minha mulher subíamos a Caetano Rufino, rumo à praça
das Sereias, na Presidente Vargas, quando na esquina surge um carro da polícia,
que para ao nosso lado. De dentro do veículo, um dos policiais nos alerta:
“Cuidado que esta área é perigosa”. Diante da inesperada abordagem, agradeci ao
guarda por sua preocupação, mas disse-lhe que morava logo adiante e conhecia
bem “a área” em que eu pisava, deveras perigosa, concordei.
2
Realmente, era um sábado à tarde, e a Campina, como todo bairro central de
grandes cidades aos finais de semana, esvaziada do movimento do dia a dia,
respirava um ar de desalento, as ruas vazias propícias à ação da bandidagem. O
policial tinha sido, reconheçamos, atencioso, preocupado com a exposição,
digamos, indevida daqueles cidadãos supostamente do bem – eu e minha mulher.
Mas o que esperamos da polícia é que efetivamente nos proteja, em vez de
alertar sobre a ameaça de assaltos. E isto se faz com ronda e vigilância constantes.
3
Quem acompanha esta coluna, ou dela seja leitor eventual, já deve ter lido (ou
flagrado, para nos valermos de uma linguagem mais apropriada ao clima policial)
diversas vezes sobre a violência, a criminalidade que acompanha o nosso
cotidiano – bem a propósito, a coluna de anteontem, “Um dia na vida do
belenense”, versava (agora me permitam a licença poética) sobre este assunto.
4
E se já retorno ao tema o faço por causa de reportagem publicada, também na
quarta-feira passada, no caderno Polícia do DIÁRIO, intitulada: “Bairro da
Campina: moradores são reféns do medo”. “Durante o dia ou à noite, insegurança
é constante em pleno centro de Belém”, informa o texto, que destaca, em
particular, a ação – filmada por câmeras de rua – de assaltantes na passagem
Fiúza, aqui pertinho de casa.
5
Olhem, se o que já escrevi sobre a criminalidade em Belém daria um livro de bom
tamanho, um bom capítulo desse livro, ou até mesmo um opúsculo, seria
preenchido com os relatos de roubos, assaltos e arrombamentos ocorridos aqui na
Campina.
6
Para desanuviar o clima, mas sem deixar de respirá-lo, vou recontar um episódio
engraçado, ou tragicômico, que dá bem a dimensão do medo, da insegurança, do
permanente estado de alerta que vivemos os campineiros (o que não é exceção,
mas praticamente é regra para toda a população belenense, como contei na coluna
anterior). Vamos ao caso.
7
Chegava em casa exatamente num sábado, trazendo do carro, deixado no
estacionamento do lado de lá da rua (outro perigo essa travessia), bregueços
vários, de livros a guarda-chuva.
Pego a chave para abrir a porta e sinto que algo me espeta a costela, pressionando-a. Elementar, meu caro leitor: é um assaltante com uma arma, que surgiu do nada, como eles surgem, ainda que eu tenha olhado em torno, precavido – como rezam os manuais de segurança.
Pego a chave para abrir a porta e sinto que algo me espeta a costela, pressionando-a. Elementar, meu caro leitor: é um assaltante com uma arma, que surgiu do nada, como eles surgem, ainda que eu tenha olhado em torno, precavido – como rezam os manuais de segurança.
8
Sinto a pressão do cano do revólver mais forte entre as minhas costelas. Mas o
ladrão permanece estranhamente em silêncio. Já me dispunha a levantar os braços
quando me dei conta do que acontecera.
9
Ao levar a chave de casa até a fechadura, trouxe junto o guarda-chuva, que eu
segurava na horizontal, sustentado entre a lateral da barriga e o braço
direito, a ponta para frente e o cabo em gancho para trás. Ao realizar o
movimento de girar a chave, o cabo se enganchou às minhas costas, o que me
levou a supor que era o assaltante com uma arma que me surpreendia.
10
Olhei em torno e certifiquei-me que nenhum vizinho flagrara aquela estranha
cena, como que se eu obedecesse a um comando, “estátua!”, da brincadeira infantil.
Era uma situação digna do antigo seriado “Os 3 Patetas” – ou, numa versão
“cabeça”, de um filme de Jacques Tati.
11
Mas não riam – quer dizer, podem rir. Eu mesmo quase tive um acesso de riso
quando, aliviado, constatei o que ocorrera. Afinal, temos justificados motivos,
decorrentes da insegurança reinante, para nos manter alertas.
12
Por isso, sorria (como diria aquele personagem do Chico Anysio) se for só o
cabo de seu guarda-chuva fazendo as vezes de assaltante. E lhe dando um toque –
nas costelas – para não marcar vacilo.
https://www.facebook.com/elias.ribeiropinto/posts/10204923377105820
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